Uma pesquisa conduzida pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) em cinco capitais brasileiras aponta que a baixa percepção de risco das doenças imunopreveníveis, a dificuldade de acessar o serviço de vacinação no horário de atendimento e o medo de reações adversas são elementos mais importantes do que as fake news para afastar as pessoas da vacinação.
Os resultados foram apresentados no último sábado (17) pela chefe de saúde e HIV do Unicef no Brasil, Cristina Albuquerque, na Jornada Nacional de Imunizações, realizada via internet pela Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) entre quinta-feira (15) e sábado.
A pesquisa ouviu cerca de 100 participantes em 10 grupos focais compostos por famílias de Curitiba, Goiânia, Rio de Janeiro, São Luís e Belém. Em cada capital, foi ouvido um grupo totalmente favorável às vacinas e outro total ou parcialmente contrário. O objetivo do estudo qualitativo era entender a queda das coberturas vacinais em crianças de até cinco anos, fato que preocupa especialistas e o Ministério da Saúde.
Entre os grupos favoráveis à vacinação, o medo de efeitos adversos pós-vacinação, a baixa percepção de que essas doenças ainda representam risco e a dificuldade de acessar o serviço de saúde no horário de atendimento foram os principais fatores relacionados à hesitação, termo que se refere ao atraso ou recusa em se vacinar quando a imunização está disponível gratuitamente. Já entre os grupos contrários às vacinas, adiciona-se a esses fatores a “preferência por tratamentos naturais em lugar da vacina, devido a crenças individuais ou falta de confiança em relação às motivações da indústria farmacêutica ao produzir as vacinas”.
O estudo aponta que “apesar de os participantes receberem informações negativas e/ou falsas sobre a vacinação nas mídias sociais, esse tipo de “notícia” não tem tido influência significativa na decisão de vacinar, ou não, as crianças”. Entretanto, a pesquisa identifica que essas notícias contribuem para o receio de efeitos colaterais mesmo no grupo favorável às vacinas.
Entre todos os grupos, foi considerado fator favorável à decisão de vacinar a obrigatoriedade de apresentação da caderneta de vacinação de crianças menores de cinco anos para ter acesso a programas sociais. Os grupos favoráveis à vacinação consideraram a obrigatoriedade positiva para a saúde coletiva, enquanto os contrários, avaliaram que a prática é negativa, apesar de terem reconhecido esse é o fator que os leva à vacinação.
As mesmas questões foram levadas pelo Unicef a 14 especialistas de oito capitais brasileiras, que apontaram, de forma unânime, a baixa percepção de risco é o principal fator para a hesitação vacinal no Brasil.
“Há uma ideia de que várias doenças imunopreveníveis já não constituem ameaças às crianças”, resume Cristina. “Toda uma geração passada foi vacinada e isso resultou no controle de muitas doenças imunopreveníveis. Os filhos dessa geração já não estão vacinando seus filhos, porque muitas doenças já tinham sido erradicadas”.
Os especialistas também apontaram as dificuldades de acesso à vacinação no horário de funcionamento das unidades como um problema, e acrescentaram que o tempo de espera e situações pontuais de falta de vacinas também contribuem para a desmotivação. Além disso, os especialistas na área identificam falta de estrutura física, tecnológica e humana das salas de vacinação, e pedem que haja treinamento contínuo dos profissionais.
A partir dos resultados, o Unicef recomenda que as campanhas de vacinação sejam mais abrangentes e mobilizadoras, com informações sobre a vacina e a gravidade da doença que ela previne, além da possibilidade de reações adversas. Também são consideradas importantes a ampliação dos horários de atendimento, a capacitação permanente dos trabalhadores das salas de vacina e parcerias entre as redes públicas de saúde e educação.
Ministério da Saúde
Procurado pela Agência Brasil, o Ministério da Saúde afirmou que o Programa Nacional de Imunizações identifica uma série de fatores que podem estar relacionados à queda das coberturas vacinais nos últimos anos, alguns deles também apontados pela Unicef. O Ministério enumera que podem estar pesando: 1) O sucesso das ações de vacinação que podem causar falsa sensação de que não há mais necessidade de se vacinar; 2) Desconhecimento individual sobre a importância dos benefícios das vacinas (baixa percepção de risco de doenças imunopreveníveis); 3) Horários de funcionamento das unidades de saúde incompatíveis com a rotina de trabalho, atividades da população, dificultando o comparecimento aos postos de saúde para vacinação; 4) Alimentação irregular do sistema de informação; 5) Medo de eventos adversos pós-vacinação; 6) Fake News; 7) Rotatividade de profissionais nas salas de vacina, dentre outros.
Diante disso, o Ministério da Saúde afirma que tem atuado por meio do PNI e da Atenção Primária à Saúde em diversas frentes. “Dentre as atividades para este fim, pode-se elencar o Movimento Vacina Brasil que tem como objetivo: resgatar o sentimento de segurança, orgulho e comprometimento dos pais e responsáveis em relação à saúde dos filhos, desmistificar as fake news, ações integradas entre órgãos públicos e empresas, mobilização de influenciadores, representantes da classe médica, profissionais de saúde, artistas, atletas e personalidades para amplificar o alcance das mensagens”.
Entre as ações do Movimento Vacina Brasil, a pasta destaca: “Campanhas de vacinação, quatro etapas de vacinação contra o sarampo, realizadas em 2019 e 2020, Programa Saúde na Hora (ampliação dos horários de funcionamento das unidades de saúde), Canal de Serviço do Ministério da Saúde no combate a Fake News, parcerias com sociedades científicas, órgãos de classe, órgãos públicos, Rotary, Lions, dentre outras, e também a divulgação para todos os profissionais de saúde sobre os dez passos para ampliação das coberturas vacinais na Atenção Primária à Saúde (1 – Garantir sala de vacina aberta todo horário de funcionamento da UBS, 2 – Evite barreiras de acesso, 3 – Aproveite as oportunidades de vacinação, 4 – Monitore a cobertura vacinal, 5 – Garanta o registro adequado de vacinação, 6 – Oriente a população sobre atualização do calendário vacinal, 7 – Combata qualquer informação falsa (fake news) sobre vacinação 8 – Intensifique as ações de vacinação em situação de surto, 9 – Promova a disponibilidade e a qualidade das vacinas ofertadas à população 10 – Garanta pessoal treinado e habilitado para vacinar durante todo tempo de funcionamento da unidade”.
Agência Brasil